O paraíso transformado em lixo

/
sexta-feira, 4 de setembro de 2015


Vergonha, vergonha, vergonha.


“Esta irmã clama contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou. Crescemos a pensar que éramos seus proprietários e dominadores, autorizados a saqueá-la. A violência, que está no coração humano ferido pelo pecado, vislumbra-se nos sintomas de doença que notamos no solo, na água, no ar e nos seres vivos. Por isso, entre os pobres mais abandonados e maltratados, conta-se a nossa terra oprimida e devastada, que ‘geme e sofre as dores do parto’ (Rm 8, 22). Esquecemo-nos de que nós mesmos somos terra (cf. Gn 2, 7). O nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta; o seu ar permite-nos respirar, e a sua água vivifica-nos e restaura-nos”.

As palavras acima correspondem ao número 2 da Carta Encíclica do papa Francisco, Laudato Si (sobre o cuidado da casa comum) lançada em todo o mundo no dia 18 de junho. Tem tudo a ver com as crises existenciais por que passa a humanidade. Que crises são essas? Não conseguimos mais medir as consequências do mal ao próximo; da violência contra a humanidade e a natureza e nem sequer conhecer o nosso vizinho. Caminhamos para um caminho sem volta, nos canibalizamos e voltamos a ser bárbaros. Os meios de comunicação em nossas mãos são armas potentes, prontas a destruir a imagem de quem quer que seja – não importa se o dono da imagem está morto ou doente. Onde está o sentido da vida em nossos dias?

Como bem escreve o papa em sua encíclica, “a nossa casa comum se pode comparar ora a uma irmã, com quem partilhamos a existência, ora a uma boa mãe, que nos acolhe nos seus braços” (nº 1), mas onde está esse cuidado? Se a casa é de todos, por que uma criança é obrigada a deixar o seu país de origem em busca de sobrevivência em um continente do outro lado do mundo e na viagem perde a vida? Se a casa é comum, por que todos nós não convivemos como irmãos? Já não há partilha, a terra não é mais nossa mãe, nem nossa irmã. Os fatos nos fazem questionar. As pessoas engolem-se todos os dias em busca de lucros, uma posição de destaque na sociedade e países atacam-se com armas. Armam-se também contra a sua própria população com a munição dos impostos que destrói a nossa capacidade de viver livres nos braços da mãe terra.



Imagens da (des) humanidade

As duas imagens acima estão correndo os jornais e redes sociais em todo o mundo. A obra esculpida na areia da praia de Puri, na Índia, dispensa comentários. O artista indiano Sudarsan Pattnaik retrata o pequeno Aylan Kurdi que morreu afogado quando ele e a família fugiam das atrocidades causadas pelo grupo que se autointitula Estado Islâmico, na Síria. A família tentavam atravessar de barco da Turquia para a Grécia nesta quarta-feira (2). O destino final seria o Canadá onde moram parentes.

Na segunda imagem, uma criança disputa espaço com adultos, durante distribuição de alimentos, em frente à estação ferroviária Keleti, em Budapeste, na Hungria. A foto é de Frank Augstein. Temos tanto, mas nossa incapacidade de viver como irmãos a partilha do amor nos afasta do propósito final imaginado por Deus. Precisamos urgentemente reconhecer que todos juntos somos responsáveis pelos danos que vem maltratando o planeta, desfigurando e destruindo a nossa casa comum que um dia, se assim continuar, não será mais habitável.



Os comentários serão administrados pelo autor do blog. Conteúdos ofensivos ou afirmações sem provas contra terceiros serão excluídos desta página.

Comentários