O mundo pede socorro e o papa aponta uma luz

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quarta-feira, 16 de setembro de 2015



Atualmente o mundo conta com mais de 7 bilhões de pessoas que geram 1,3 bilhão de toneladas de lixo, quantidade que deve chegar a 2,2 bilhões de toneladas em 2025, segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Ainda conforme os relatórios da ONU, atualmente mais de 1 bilhão de pessoas, o equivalente a 18% da população mundial, não tem acesso a uma quantidade mínima aceitável de água potável. E em 2025 – dois terços da população mundial ou 5,5 bilhões de pessoas, poderão não ter acesso à água limpa.

É com base em estudos científicos como esses, que apontam um cenário catastrófico já em nossos dias, que o papa Francisco lançou no dia 18 de junho, a sua segunda Carta Encíclica, Laudato Si (Louvado sejas – sobre o cuidado da casa comum) “a cada pessoa que habita neste planeta” (nº 3). Segundo o subsecretário-geral da ONU para o Pnuma, Achim Steiner, é “o chamado à ação feito por Francisco face à degradação global do ambiente e as mudanças climáticas”.

Estudiosos já declararam ser superficial classificar a carta apenas como encíclica verde porque a visão do papa é teológica e metafísica, ou seja, fundamentada na fé e na razão a partir da investigação das realidades que transcendem a experiência sensível.

Para começo de conversa, é indispensável destacar que Laudato Si, mi Signori – Louvado Sejas, meu Senhor – era o cântico de São Francisco de Assis em que “recordava-nos que a nossa casa comum se pode comparar ora a uma irmã, com quem partilhamos a existência, ora a uma boa mãe, que nos acolhe nos seus braços”. Assim cantava o santo. “Louvado sejas, meu Senhor, pela nossa irmã, a mãe terra, que nos sustenta e governa e produz variados frutos com flores coloridas e verduras” (nº1).

Visão científica

Para o doutor em Ecologia e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) Rafael Dias Loyola, quatro pontos fundamentam a encíclica e tornam o documento relevante. “O papa Francisco apresenta um problema; explica no texto que ele é global; convoca as pessoas a fazerem algo a partir de linhas de ação e deixa claro que o problema perpassa o ambiental e atinge também o social e econômico”. Segundo o professor, a comunidade científica mundial recebeu muito bem o documento porque o texto ratifica o que eles vêm dizendo há muito tempo: “estamos diante da maior emissão de gases de efeito estufa da história, causado pelo homem; diante de uma crise hídrica sem precedentes, devido principalmente a uma gestão irresponsável e o papa, como líder religioso e uma força política que os cientistas não têm, faz ouvir no mundo inteiro esse problema que é de todos nós”.



Igreja pode fazer mais

Mas a publicação de Laudato Si e o impacto que causou um papa ao falar sobre meio ambiente, conforme o professor Rafael, é apenas um primeiro passo. “O documento tem um peso político muito grande no mundo e acaba atraindo as pessoas na sociedade e na Igreja, mas poderá fazer a diferença se ele for amplamente divulgado, discutido e debatido; se cada padre em sua paróquia falar a respeito com os fiéis, aí sim, haverá uma educação ambiental mínima”. O professor considera também que a encíclica é um alerta para as pessoas se conscientizarem de que elas são parte do problema, que contribuem para o mundo estar piorando e isso, associado à fé, faz uma diferença muito grande.

A chave do documento, conclui o especialista, é o papa ter fundamentado ao longo do texto que o problema é também social e que os pobres sofrerão mais com a degradação do meio ambiente. “O papa chama a atenção dos governos para assumirem uma postura nova principalmente em relação aos mais pobres que não têm condições de lidar com escassez de água, aumento da temperatura e falta de alimento nas mesas”.

O professor da Escola da Fé e mestre em Ciências da Religião, Onofre Guilherme, diz que Laudato Si é um convite do papa à mudança de mentalidade, que só pode ser alterada verdadeiramente a partir de uma espiritualidade de cuidado, do zelo para com a criação e para com os homens e mulheres que habitam o planeta. “Francisco faz um pedido no sentido da afirmação da dignidade profunda da pessoa humana, perdida no horizonte pobre do mundo do consumo exacerbado”.
Onofre ressalta ainda que cabe aos cristãos, de modo especial, o cultivo de uma espiritualidade autenticamente ecológica que, “associada à educação ajuda, assim, na superação da tentação de um espírito consumista que provoca violência e destruição na medida em que poucos são os seres humanos que possuem pleno acesso aos bens de consumo”.

São Francisco de Assis

O bispo auxiliar de Goiânia, Dom Levi Bonatto, entende que o documento só terá efeito se ele for amplamente divulgado. Por isso, faz um apelo à Igreja. “As palavras do papa só irão ecoar se o documento estiver nas mãos das pessoas e isso só acontecerá se cada paróquia e comunidade, por meio dos seus padres, fizerem isso e houver uma divulgação nos meios de comunicação sobre a importância da nova encíclica”. Dom Levi vê de forma positiva o impacto que causou o lançamento da encíclica no mundo inteiro. Ele diz que a Igreja precisa aproveitar esse momento para levar a todos a mensagem de Francisco sobre essa problemática global.

Sobre a centralidade de São Francisco na encíclica, Dom Levi explica que o santo foi “o transformador de uma Igreja que estava voltada para si mesma, tinha muitos bens, e ele achou que era necessário o desprendimento, por isso, fez a reforma. Hoje o papa Francisco quer mostrar que para viver o que está escrito no documento é preciso uma transformação e mudança a partir das pessoas, pois não é possível continuarmos apegados aos bens materiais enquanto o mundo sofre as consequências”.

Estudo do documento

As paróquias e vicariatos são convidadas a se envolverem concretamente na multiplicação do conhecimento da Carta Encíclica Laudato Si, trazendo para o dia a dia da comunidade o denso e profundo conteúdo nela apresentado. Esse é o caminho que a Igreja de Goiânia irá trilhar a partir de agora, segundo Dom Levi. O professor Onofre Guilherme se coloca à disposição para esse serviço. O contato dele é onofre.goiania@gmail.com. A encíclica pode ser encontrada em todas as livrarias católicas.

Você sabia? A Carta Encíclica é uma circular enviada pelo papa a todos os bispos e por meio deles aos padres e fiéis, sobre um determinado assunto que quer tratar nos campos da fé, costumes, culto, doutrina social. Pode-se estender também a todos os homens de boa vontade, como é o caso da Laudato Si. Acredita-se que a primeira encíclica foi escrita pelo papa São Clemente (89-98). O termo “epistola encyclica” foi introduzido pelo papa Bento XIV (1740-1758).

Publicado originalmente no Jornal Encontro Semanal, da Arquidiocese de Goiânia
Reportagem: Fúlvio Costa
Fotos: André Costa
Montagem: Caio Cézar
Infográfico: Ana Paula Mota
Revisão: Jane Greco 




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